RÚSSIA, PUTIN E CORONAVÍRUS
A
Terra respira. A vida está em pausa. Animais em todos os países
aproveitando o espaço livre de humanos. Os seres humanos
redescobrindo, ou em alguns casos descobrindo, como é ocupar o tempo
dentro do lugar em que escolheram como suas casas.
E
em meio a tudo isso aqui estou, em plena Rússia. Chegou a hora do
maior país deste planeta também enfrentar esse novo vírus. Em russo, коронавирус (fala-se 'karanavírus'). E como
está esta luta? Do meu ponto de vista pessoal, bem, poderia estar
melhor? Sim. Poderia. O governo de Putin fez tudo correto, porém
esqueceu algo básico: o ser humano.
Em
janeiro, quando das primeiras notícias sobre a epidemia na China,
comecei a acompanhar as notícias internacionais e os jornais da
Rússia uma vez que viajaria no dia 02 de fevereiro. As medidas
iniciais do governo russo foram consideradas drásticas por alguns
países, mas ele não quis saber e na última semana de janeiro
fechou as fronteiras aéreas e terrestres com a China e proibiu as
agências de viagens venderem pacotes e viagens à China. A Mongólia
fez o mesmo. E em seguida proibiram a
entrada de turistas chineses e depois de qualquer pessoa vinda da
China. Quando a situação na cidade
chinesa de Whuan saiu do controle tanto a Rússia quanto a Mongólia
estavam blindados.
A principal avenida de St. Petersburgo segunda, 06 de abril. |
Ao
chegar na Espanha achei estranha a grande
quantidade de chineses fazendo turismo e isso foi motivo de conversa
com alguns amigos lá. Vou abrir um parênteses aqui antes que digam:
“Que pensamento preconceituoso!” e de certa forma reconheço que
foi. Mas eu estava informada via meios russos e asiáticos e era um
pouco óbvio que a Rússia não teria fechado suas fronteiras e
proibido a entrada de chineses se a situação não fosse realmente
grave. Conseguem
imaginar o enorme problema diplomático entre os dois países
vizinhos que seria uma decisão dessa se não fosse um caso
extraordinário? Com essas informações vejo como muito natural a
minha preocupação quando vi aqueles turistas por Madri. E realmente
ninguém na Europa realmente se preocupava com um problema lá longe.
E quando cheguei em Moscow, a ausência de turistas chineses era o
que chamava a atenção e estava claro que as medidas sobre as quais
eu tinha lido estavam sendo aplicadas.
Quando
chegou um fim de semana de fevereiro que o número de contágios na
Itália subiu de tal forma que chamou a atenção àquele país,
o governo russo proibiu os voos com a Itália e de receber italianos.
Os países europeus, em geral, criticaram a Rússia, mas Putin não
voltou atrás em sua decisão. Assim que a
Rússia continuava blindada. A situação na Europa começou a ficar
problemática, crítica, dramática e aqui, eu e
todos na Rússia nos sentíamos em segurança porque
o governo russo tomou as medidas antes que os demais.
Os primeiros casos de pessoas que chegaram ao país e que estavam
infectadas foram em fevereiro e foram direto para a quarentena.
A
situação na Europa que era dramática passou a desesperadora na
segunda semana de março. Na terceira
semana, vimos
países europeus, pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial,
anunciarem o fechamento de suas fronteiras aéreas, terrestres
(alguns também marítimas) e proibirem a circulação de pessoas e a
entrada de estrangeiros. Foi um choque!!! Lembro-me muito bem: isso
tudo aconteceu entre o sábado 14
de março e quinta 19
de março. Na segunda, 16
de março eu estava me sentindo tão perdida que
comecei a conversar com a família e alguns amigos que
moram na Europa e a ver possibilidades e
todas as possibilidades iam fechando fronteiras conforme as horas
passavam. As notícias com os anúncios dos países europeus iam se
acumulando e se aglomerando. Comecei a receber e-mails e mais e-mails
cancelando passagens, algumas com datas para final de abril! Jamais
conseguirei explicar em palavras a sensação de impotência e de não
saber o que fazer que eu senti nos dias 16 e 17. Naquele
16 de março o número oficial de contagiados na Rússia era 45.
Na terça 17, fui ao Museu Hermitage e já estava o aviso na porta que o trabalho voluntário seria interrompido. Tomei um chá com o pessoal e fui embora. A vida transcorria normal mas já era possível ver menos pessoas nas ruas, algumas lojas com horários de trabalho reduzidos e museus particulares com cartazes de fechados. No dia seguinte, 18 de março, o Hermitage e todos os pontos turísticos do país foram fechados. E neste mesmo momento começamos a saber que os primeiros contágios também estava na Rússia. Os pacientes zeros (essa é a informação pública) foram russos que chegaram de férias da Itália via Irã na primeira semana de março. Os voos com a Itália estavam proibidos e como alternativa muitos russos voltaram ao país via Irã que logo provou ser outro grande centro de contágios. O governo russo também fechou a fronteira aérea com o Irã em seguida. Continuávamos blindados e a esses russos foi pedido que fizessem uma auto quarentena. Mas com o passar dos dias alguns deles acharam que estavam bem, que não era mais necessário ficar em casa e o fim da história todos conhecemos. Também soubemos de casos de duas mulheres, em cidades diferentes, que foram levadas do aeroporto direto a um hospital/centro onde deveriam ficar por 14 dias e elas disseram que não recebiam informações, era como uma prisão e por isso decidiram escapar. Uma tinha chegado de Milão onde foi passar as férias. Daí eu ter escrito acima o fator humano que o governo não considerou.
Na terça 17, fui ao Museu Hermitage e já estava o aviso na porta que o trabalho voluntário seria interrompido. Tomei um chá com o pessoal e fui embora. A vida transcorria normal mas já era possível ver menos pessoas nas ruas, algumas lojas com horários de trabalho reduzidos e museus particulares com cartazes de fechados. No dia seguinte, 18 de março, o Hermitage e todos os pontos turísticos do país foram fechados. E neste mesmo momento começamos a saber que os primeiros contágios também estava na Rússia. Os pacientes zeros (essa é a informação pública) foram russos que chegaram de férias da Itália via Irã na primeira semana de março. Os voos com a Itália estavam proibidos e como alternativa muitos russos voltaram ao país via Irã que logo provou ser outro grande centro de contágios. O governo russo também fechou a fronteira aérea com o Irã em seguida. Continuávamos blindados e a esses russos foi pedido que fizessem uma auto quarentena. Mas com o passar dos dias alguns deles acharam que estavam bem, que não era mais necessário ficar em casa e o fim da história todos conhecemos. Também soubemos de casos de duas mulheres, em cidades diferentes, que foram levadas do aeroporto direto a um hospital/centro onde deveriam ficar por 14 dias e elas disseram que não recebiam informações, era como uma prisão e por isso decidiram escapar. Uma tinha chegado de Milão onde foi passar as férias. Daí eu ter escrito acima o fator humano que o governo não considerou.
Os
aeroportos de Moscow começaram a ser mais cuidadosos e
o presidente dizia que a situação estava
sob controle. Os números de contágios
começaram tímidos porém na semana
de 24 de março começaram a subir de forma
muito rápida. O espaço aéreo foi fechado
aos estrangeiros. Saímos
de 45 para 109, 200 e 342 e daí na quinta 26 de março, quando
ultrapassava os 600 casos o presidente
Vladimir Putin fez um pronunciamento em rede nacional de
televisão informando que todo o território
russo faria pausa de uma semana para evitar a circulação do
vírus e declarou uma semana de
feriado nacional pago que começaria
no sábado 28 de março até o domingo 05 de abril. Voos
internacionais proibidos. Fronteira terrestre fechada. Parques
e praças ganharam uma faixa proibindo seu uso. E
nesta semana Moscow, o grande foco de contágio e de contagiados do
país, seria totalmente fechada somente funcionando supermercados,
farmácias e hospitais. Na sexta-feira, depois de perceberem o número
de pessoas procurando por viagens na internet, o governo decidiu
suspender os voos low coast
nacionais e os governadores das cidades mais turísticas do país
decidiram tomar medidas mais extremas como as de Moscow e fechar tudo
para evitar os que queriam turistar durante o
feriado nacional. Inclusive alguns resorts
suspenderam suas páginas de reservas. Na sexta fui ao mercado e
aqui em St. Petersburgo não havia nenhum desespero da população,
no entanto, claramente todos estavam se abastecendo. As cestas de
compras estavam com produtos essenciais como pão, carnes, ovos,
leites, latas e conservas. Durante o caminho de volta vi praticamente
todos como eu: com uma ou duas bolsas de compras nas mãos. E assim
as cidades ficaram vazias. Vi pelas notícias que o governo estava
reclamando com a população que estava saindo para passear. A
porcentagem era de 18% da população. A grande maioria estava em
casa.
Já
no domingo 29, o governador de Moscow, após
a divulgação do número de contágios que
teve um aumento enorme, anunciou que a
partir da segunda 30 de março, a cidade entraria oficialmente em
quarentena obrigatória. As demais cidades,
ao se aproximar o final do feriado nacional pago e vendo os números
de contágio aumentarem de forma extraordinária e o aumento do
número de mortes, decidiu aderir à quarentena e a partir desta
semana de 06 de abril, todo o território nacional russo assim
permanecerá até 30 de abril.
As penalidades para quem descumprir a
quarentena são várias, desde multas que vão subindo da primeira à
terceira vez que forem pegos,
sendo que depois desta irá preso. Com penalidades de até 7 anos de
prisão às pessoas que não cumprirem a quarentena e sua saída
tiver como consequência contágio e morte de uma ou mais pessoas.
Também há penalidades para as empresas que querem continuar
funcionando quando estão proibidas de fazê-lo (ou seja, obrigando funcionários/as a comparecer). Os voos nacionais
continuam proibidos, exceto em casos comprovados de trabalho ou para
visitar um parente doente. A maioria da
população usa máscaras. O governo não falou nada sobre o assunto,
mas o pensamento geral é fazer como os vizinhos chineses. Quem não
tem cobre o nariz e a boca com cachecol. E
visitantes, como eu, não podem mudar de cidade durante a quarentena.
O
governo fez tudo certo, particularmente, só
acho que deveriam ter realmente isolado os primeiros casos de forma
obrigatória e não como auto isolamento quando em outros países
isso não funcionou porque claramente nem todas pessoas têm
consciência social e comunitária.
É possível que os números sejam maiores? Sim, mas como tomou medidas importantes logo no início pode ser uma explicação para ter demorado a chegar aqui. Vai saber!
07/04/2020 - The Moscow Times |
08/04/2020 -The Moscow Times |
É possível que os números sejam maiores? Sim, mas como tomou medidas importantes logo no início pode ser uma explicação para ter demorado a chegar aqui. Vai saber!
Há
muitas outras medidas que foram tomadas mas este post já está grande. Caso alguém tenha interesse
em saber é só perguntar. Ah, um último detalhe: o governo russo
não soltou leões ou ursos nas ruas para ajudar na quarentena. 😉
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